A palavra aramaica "Abba" - que significa papai - expressa muito bem quem é o verdadeiro Deus dos cristãos: Aquele que quer se relacionar conosco como o nosso Papai, o Deus que é amor incondicional...





sábado, 12 de novembro de 2011

Quando tudo não é o bastante



         A palavra hebraica "shalom", que geralmente é traduzida como "paz", na verdade significa muito mais do que isso. Ela traduz a plenitude. Ela simboliza a plena saciedade. "Shalom" quer dizer harmonia, estado máximo de bem-estar. É isso que Deus deseja para a humanidade. Mas este estado de vida somente é possível de ser alcançado por aqueles que desfrutam de um relacionamento pessoal com o Criador.

         O rabino Harold Kushner fez uma brilhante leitura do livro de sabedoria hebraica chamado Eclesiastes. À esta sua obra o autor deu o título "Quando tudo não é o bastante".  A Bíblia Sagrada nos mostra que dentro de nós há um abismo, um poço sem fundo. Esse vazio somente pode ser preenchido pelo shalom de Deus. Sem Deus, não adianta ter tudo aquilo que a vida pode oferecer de bom. Por isso vemos tanta gente que tem de tudo e, ainda assim, vive com um infinito senso de falta. Precisa sempre de mais um gole, de mais um trago, de mais uma propina, de mais uma transa ilícita num lugar perigoso.

         É por isso que na oração que Jesus nos ensinou, o "Pai Nosso", Ele nos orienta a pedir o "pão de cada dia". Não é de comida que Ele está falando. O próprio Cristo nos disse que não precisávamos nos preocupar com o que haveríamos de comer. O que Ele quer nos mostrar aqui é que devemos pedir a Deus não o pão material, mas o pão que nos sacia eternamente, o Pão da Vida. Devemos ansiar pela fartura plena. Aquela que preenche os buracos da alma! Pois, infelizmente, há aqueles que tudo têm, mas esse tudo nunca é o suficiente.

        Sem Deus, mesmo que tenhamos tudo, esse tudo não será o bastante. Caminhar com Jesus não é seguir códigos morais, dogmas e rituais religiosos. Andar com Cristo é aprender a ter saciedade plena. É aprender a desenvolver essa satisfação espiritual, independentemente das coisas que possuímos ou deixamos de possuir. O maior bem que precisamos ter é a intimidade com o Senhor! Pois, assim, aprendemos a estar contente em toda e qualquer situação.

       O apóstolo Paulo também nos ensina isto quando diz: "Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece" Fp 4:12-13.

        Que nós possamos aprender a ter a plena paz a cada dia. Fartura de alegria. É curioso como Deus dá dons diferentes às suas criaturas e estas, ainda que não estejam conscientes, declaram a grandeza das Suas obras... Aliás, pode ser que tenha sido nisso que pensou a cantora Marisa Monte, quando fez sua descrição de Paraíso, que talvez seja uma das melhores já feitas:

Há um vilarejo ali
Onde areja um vento bom
Na varanda, quem descansa
Vê o horizonte deitar no chão

Pra acalmar o coração
Lá o mundo tem razão
Terra de heróis, lares de mãe
Paraíso se mudou para lá

Por cima das casas cal
Flores em qualquer quintal
Peitos fartos
Filhos fortes
Sonho semeando o mundo real

Toda gente cabe lá
Palestina, Shangri-lá
Vem andar e voa
Vem andar e voa
Vem andar e voa

Lá o tempo espera
Lá é primavera
Portas e janelas ficam sempre abertas
Pra sorte entrar

Em todas as mesas pão
Flores enfeitando
Os caminhos, os vestidos, os destinos
E essa canção

Tem um verdadeiro amor
Para quando você for...

        Quanto mais próximos formos de nosso Criador, mais teremos a sensação de saciedade e de plenitude, que vem dele. Pois certo é que nenhuma riqueza desse mundo pode satisfazer um coração com sentimento de eterna falta, pois este tem dentro de si uma sanguessuga. Que o nosso objetivo seja nos enchermos daquele que sacia a nossa alma, o Pai celestial.

Shalom!


quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Bicho, coisa ou gente?



            Um dos grandes males do Século XXI é a coisificação das pessoas. Parece-me claro que Deus criou as pessoas para serem amadas e as coisas para serem usadas. Mas o grande fenômeno da nossa sociedade pós-moderna é justamente o oposto, usamos pessoas e amamos coisas. O amor exagerado às coisas e o uso indiscriminado das pessoas. Isso sim pode ser chamado de um grande pecado, pois deturpa a imagem e semelhança de Deus em nós! Quando alguém trata um ser humano como uma coisa, mesmo que não saiba, ofende a dignidade intrínseca que nos foi dada justamente por termos sido feitos à imagem e semelhança do Criador.

            A busca desesperada pela tríade mais famosa do mundo moderno - sexo, poder e dinheiro - conduz as pessoas à perdição. Gente atropelando gente. Gente tratando gente como bicho com um único objetivo: mais sexo, mais poder e mais dinheiro. Esse caminho é terrível,pois destrói não só aquele que vive nele, mas também seus familiares. Quantos lares já ruíram por causa dos desejos desenfreados e cegos de alguns!

            Quanto mais cativos dessas paixões sem limites nós somos, menos humanos nos tornamos. A gente acaba se tornando um ser bestial. Movido pelo instinto animal. A coisificação das pessoas anula a integridade que é própria daqueles que foram feitos com tanto cuidado por seu Criador. Jesus nunca exigiu de seus seguidores que eles fossem seres "desencarnados", que se abstivessem de viver suas vidas e as curtissem da melhor maneira possível. A questão é se nós temos feito isso de maneira sadia, segundo a perspectiva cristã.

            Os instintos animais estarão sempre presentes em nossas vidas. Até porque, no caso do sexo, por exemplo, trata-se de uma questão de sobrevivência da humanidade. Sem sexo a humanidade se extinguiria. O problema todo é como nós estamos lidando com a questão sexual. Se nós somos daqueles que nos deixamos levar pelos instintos naturais, precisamos repensar o assunto. Pois Cristo nos ensina a dominar nossos apetites e nossos desejos.

            Precisamos é deixar de viver como bichos. Somos humanos e podemos decidir o que fazer com nossos apetites. Somos a única espécie que tem a prerrogativa de não precisar seguir os próprios instintos. Precisamos transcender as nossas animalidades! Os desejos são sinais até de boa saúde. Portanto, não é razoável imaginarmos que um sujeito convertido deixará de ter desejos. É saudável ter seus desejos despertados.  Mas é nossa tarefa usar nossa dimensão humana para direcionar o alvo dos nossos desejos.

             Não é legítimo que se use pessoas como objetos de satisfação pessoal para depois se jogar fora o bagaço, os restos. Na tradição da espiritualidade cristã nós aprendemos que o sexo entre duas pessoas as faz ser uma só carne. É uma relação de amor e afeto. É uma construção transcendental e profunda de sentimentos. O que a Bíblia quer nos dizer é que o caminho de bestialização do ser humano é um caminho que nos leva a destruição, não só da nossa vida, mas de tantas outras vidas que se envolvem com a gente.

            Nosso apetite legítimo não é de sexo, pois nós não somos bichos. Nós não vivemos os ciclos do cio como os outros animais. Nosso apetite, no fundo, é por afeto! Somos seres que podemos refrear nossos impulsos. Aliás, é justamente a capacidade de domínio próprio que permite que a humanidade continue existindo com um mínimo de paz, pois se cada um seguisse seus próprios instintos e desejos, o caos reinaria na Terra e o ser humano estaria com seus dias contados.

          Houve um tempo em que o dinheiro era visto como algo demoníaco pelos cristãos. Porém, hoje cremos que ele pode ser uma bênção desde que não seja elevado à categoria de "deus". O dinheiro tratado como um deus é chamado por Jesus de "Mamon", pois se torna um ídolo. Esse sim é perigosíssimo, pois nosso instinto é passar por cima de tudo e todos para conseguir nosso próprio conforto. E junto com ganância pelo poder, faz grande estrago nas vidas de muitas famílias.

              É regra de ouro do Cristianismo negar a si mesmo, lutar contra nossas tendências egoístas. Que nós possamos refletir sobre isso a cada dia. Não somos bichos que precisam fazer tudo aquilo que sentem vontade de fazer. Para que haja vida em sociedade, é necessário que nós deixemos de fazer somente o que queremos para fazermos aquilo que precisamos fazer em prol do outro, do próximo. Que assim seja!